Gabriela Cupani
Apesar de menos incidentes, os glaucomas secundários - com causas conhecidas e evitáveis - são, proporcionalmente, os que mais levam à cegueira. Isso é o que revela uma pesquisa inédita, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), que avaliou dados de quase 4.000 prontuários.
Doença que provoca a perda gradativa do campo visual, o glaucoma atinge 900 mil brasileiros e é apontado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) como a principal causa de cegueira irreversível.
Trata-se de uma doença silenciosa que provoca lesão no nervo óptico, relacionada ao aumento da pressão intra-ocular. "Essa pressão ocular elevada mata as células da retina", explica o médico Sebastião Cronemberger, líder do estudo e professor titular de oftalmologia da UFMG.
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Segundo a pesquisa, enquanto 70,3% dos portadores de glaucomas secundários perderam a visão, menos da metade (44,1%) dos que tinham glaucomas primários (quando a doença não tem causa conhecida) ficaram cegos.
O glaucoma de pior prognóstico, que cegou 95% de seus portadores, foi o neovascular. Ele é causado, por exemplo, pela retinopatia diabética, fruto de diabetes mal controlado.
Já o tipo mais comum de glaucoma, o chamado glaucoma crônico de ângulo aberto, que não tem causa conhecida, cegou 40% de suas vítimas.
Além de doenças como diabetes e hipertensão, fatores como complicações em cirurgias intra-oculares e uso inadequado de colírios também causam os glaucomas secundários.
"Os colírios com corticoides [potentes anti-inflamatórios] devem ser usados com muita cautela", frisa Cronemberger. Só no hospital da UFMG há registros de mais de uma centena de crianças com glaucoma devido ao uso indiscriminado desse tipo de medicamento.
Segundo Cronemberger, há um lacrimejamento normal e transitório que pode acontecer nas crianças com até um ano de idade, mas muitos profissionais não sabem disso e acabam receitando colírios com corticoide de forma inadequada.
Traumas oculares também podem elevar a pressão sem que a vítima perceba. Às vezes uma pancada pode romper estruturas dentro do olho sem dar nenhum sinal externo.
Outra constatação da pesquisa é que os glaucomas primários de ângulo aberto demoram muito mais para levar à perda da visão. "Eles se instalam gradualmente", explica Cronemberger. Já os secundários cegam mais rapidamente.
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Estima-se que cerca de 40% dos pacientes cheguem à primeira consulta com cegueira em um dos olhos -o que caracteriza estado avançado.
"Embora não haja cura, a medicina pode ajudar no controle por meio de diagnóstico precoce, de colírios cada vez mais eficientes e com menos efeitos colaterais", diz o oftalmologista Leôncio Queiroz Neto, do Instituto Penido Burnier, em Campinas, no interior paulista.
O grande desafio dos especialistas é diagnosticar o problema o quanto antes e preservar a visão dos pacientes. Segundo Queiroz Neto, essa não é uma tarefa fácil, pois a doença não tem sintomas e, muitas vezes, não é percebida pelo paciente até que tenha ocorrido grande perda do campo visual.
"Com tratamento correto, o glaucoma tem poucas chances de cegar, mas quanto maior a demora no diagnóstico, mais difícil o tratamento", diz oftalmologista Newton Kara José, professor da Universidade de São Paulo.
Não é possível prevenir o glaucoma primário de ângulo aberto, mas o diagnóstico precoce consegue evitar suas consequências. Por isso, recomenda-se um exame para medir a pressão intra-ocular depois dos 40 anos. A partir dos 50, o check up deve ser anual.
Quem tem casos na família, usuários de remédios com cortisona, tem doenças como diabetes ou hipertensão, deve redobrar a atenção. São os chamados grupos de risco, em que a chance de desenvolver o problema é maior.
Já grande parte dos glaucomas secundários poderia ser evitada, controlando, por exemplo, doenças de base como diabetes e hipertensão.
Fonte: Folha de S.Paulo